Fiscal que fez primeira denúncia de operação diz que há mais a ser descoberto.
Responsável pela primeira denúncia que levou a Polícia Federal a deflagrar a Operação Carne Fraca, o fiscal agropecuário do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), Daniel Gouvêa Teixeira, acredita que as investigações estão apenas no começo e devem trazer desdobramentos em outras partes do país.
De acordo com ele, ainda há “muito a ser revelado” pelos investigados presos pela operação, que inclusive poderiam firmar acordos de delação premiada para que ramificações do esquema de corrupção sejam descobertas. Para o servidor do ministério, porém, as fraudes sanitárias detectadas até agora não representam riscos imediatos à saúde dos consumidores.
Ele e outros colegas de carreira participaram nesta quarta-feira (22) de um ato em frente ao prédio do Mapa para defender as investigações, cobrar mais atenção do governo à categoria e criticar o que classificaram como “indicações políticas a cargos de chefia” no setor de fiscalização. Pouco mais de 150 pessoas participaram da mobilização, que terminou com um “abraçaço” em frente à sede, em Brasília.
Deflagrada na última sexta-feira (17), a operação cumpriu mandados judiciais de busca e prisão temporária para apurar a suspeita de que frigoríficos “maquiavam” carnes vencidas com ácido ascórbico e subornavam fiscais federais para que eles autorizassem a comercialização de produtos já impróprios para consumo.
Após suspeitar de irregularidades ao inspecionar um frigorífico no Paraná, há mais de dois anos, Daniel fez as primeiras denúncias ao ministério, mas acabou sendo afastado da fiscalização, o que fez com que ele procurasse a Polícia Federal.
“Eu acho que a população tem que acompanhar de perto para saber os desdobramentos, porque o que está acontecendo é em decorrência da corrupção no órgão, pelos diretores e coordenadores, de indicação política dos partidos no Paraná. Há pelo menos 11 anos eles se revezam na diretoria no estado”, afirma o servidor.
O fiscal conta que chegou a sofrer pressões e ameaças de morte, mas levou o caso adiante após receber proteção policial. Apesar de defender que as irregularidades sanitárias resultaram mais no barateamento da produção de carne do que em um prejuízo direto à saúde da população, Daniel diz que esta é apenas a “ponta do iceberg”.
“Eu tenho certeza que está só começando. São só dois anos e tem pessoas presas que têm relações com fiscais do Brasil inteiro. São auditores fiscais que ocupam cargo de direção e também políticos do Brasil inteiro. A gente tem a preocupação de falar só o que é permitido por causa do inquérito policial, mas pelo que tenho conhecimento do Ministério da Agricultura, acho que isso tende a se ampliar bastante. Acredito que pelo menos umas três ou quatro fases devem ocorrer ainda”, disse.
Questionado pela Agência Brasil sobre as críticas a indicações políticas, o ministério informou que as duas substituições em Goiás e no Paraná dos superintendentes regionais do órgão, após a operação ser deflagrada, já foram feitas com base em indicações técnicas. De acordo com a pasta, essa será a tendência das próximas escolhas. O ministério informou que desde novembro do ano passado uma portaria interna instituiu que as mudanças dos auditores fiscais não devem mais ser feitas pelos superintendentes regionais, mas sim pela Secretaria de Defesa Agropecuária.
De acordo com Maurício Porto, presidente do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais Agropecuários (ANFFA Sindical), a “segurança alimentar do brasileiro hoje está garantida”.
“O sistema de inspeção de produtos do ministério é robusto. Ele tem auditorias internacionais e por parte da nossa atuação também. O que se tem que combater é a corrupção, que está influenciando na qualidade do produto”, afirmou.
Em entrevista após o ato, o dirigente sindical preferiu não opinar se a operação da Polícia Federal foi exagerada devido à forma como foi veiculada. Ele afirmou que cabe aos cerca de 2,7 mil auditores apenas levantar os problemas e repassar aos investigadores. Segundo ele, porém, atualmente há uma carência de cerca de 800 profissionais da área, o que prejudica os trabalhos do órgão.