Saúde pública exige mais do que discursos: exige presença e responsabilidade

Por Gilmar Ferreira
Com todo respeito, Dr. Carlos Felipe, me dirijo ao senhor não apenas como jornalista, mas como cidadão que vive a realidade de Maringá e acompanha de perto o funcionamento — e também os desafios — do nosso sistema de saúde pública.
Assisti ao vídeo em que o senhor, representando o CRM Paraná, se manifesta em defesa dos médicos após declarações feitas pelo prefeito Silvio Barros durante visita à UPA. Respeito sua posição institucional, mas confesso que senti, em suas palavras, um certo distanciamento da realidade que a população enfrenta nas unidades de saúde do município.
Antes de sair em defesa irrestrita da classe médica e atacar a gestão pública, o senhor deveria considerar um gesto simples, porém revelador: visitar as unidades de saúde da cidade. Mas não com comitiva e agenda marcada — falo de visitas reais, discretas, como as que qualquer cidadão faz diariamente. Tenho certeza de que o senhor encontraria excelentes profissionais, comprometidos e humanos. Mas também encontraria situações lamentáveis, que infelizmente comprometem todo o sistema.
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Não é raro ouvirmos relatos de médicos que encerram o atendimento em poucas horas, mesmo estando contratados para uma jornada maior. De consultórios trancados enquanto há pacientes à espera. E, principalmente, de recusas em atender pacientes nas UBSs, sob a justificativa de que a “cota” diária foi atingida — mesmo com horas de expediente ainda a cumprir.
Já houve casos de profissionais que priorizavam representantes de laboratórios em vez dos próprios pacientes, situação que motivou a criação de uma lei municipal para coibir essa prática.
Também há relatos de médicos que deixam a unidade de saúde no horário em que deveriam estar atendendo, para prestar serviços na rede particular, o que levou à necessidade de abertura de processos administrativos.
Esses comportamentos não podem ser ignorados em nome de uma defesa corporativa. Eles impactam diretamente a população e sobrecarregam os serviços de urgência, prejudicando também a imagem da própria classe médica — o que é injusto com os muitos profissionais sérios e comprometidos.
É claro que a gestão pública tem suas responsabilidades e falhas, e elas devem ser cobradas e corrigidas com seriedade. Mas é fundamental que o Conselho Regional de Medicina também esteja atento a comportamentos que, partindo de alguns profissionais, fragilizam ainda mais o sistema de saúde. Defender a categoria médica é legítimo, mas essa defesa precisa estar alinhada com a realidade dos fatos.
Por isso, Dr. Carlos, o convido, respeitosamente, a ir além do vídeo. A dialogar com a gestão, ouvir os usuários, conversar com os servidores e acompanhar de perto o que de fato acontece nas unidades de saúde de Maringá. A boa medicina não se constrói apenas com palavras — mas com presença, responsabilidade e compromisso com a verdade.
Somente com diálogo e ação conjunta poderemos fortalecer um sistema de saúde mais eficiente, justo e digno para todos.