IA ajuda a redefinir diagnósticos e tratamentos na saúde

Presente no dia a dia da população, a inteligência artificial (IA) também é uma tecnologia de grande utilidade na área da saúde. Em 2023, por exemplo, uma pesquisa feita em hospitais privados do Brasil apontou que 62,5% das instituições respondentes já utilizavam a IA de alguma forma. O levantamento foi feito pela Associação Nacional de Hospitais Privados (Anahp) em parceria com a Associação Brasileira de Startups de Saúde (ABSS).
Em termos econômicos, o mercado de soluções de IA na área da saúde deve atingir mais de US$ 110,6 bilhões (R$ 614 bilhões, na cotação atual) em 2030, segundo análise da empresa MarketsandMarkets. A título de comparação, em 2025, a mesma companhia avalia esse segmento em US$ 21,6 bilhões (R$ 120 bilhões) ‒ ou seja, ele deve mais do que quintuplicar de tamanho em cinco anos.
Mas como a IA é aplicada no setor de saúde? Além de funções como assistentes virtuais que realizam atendimentos iniciais, auxiliam na triagem de pacientes e agilizam o agendamento de exames e consultas por aplicativos como o WhatsApp, a IA já viabiliza aplicações mais avançadas e estratégias na prestação de serviços de saúde. É o que explica Hugo Raposo, especialista em Inteligência Artificial e tecnologias aplicadas à saúde, que atuou como arquiteto-chefe de software e consultor executivo no Ministério da Saúde da Província de Ontário, no Canadá.
“A resposta para muitos dos desafios atuais está no desenvolvimento de uma plataforma baseada em IA, capaz de unificar prontuários médicos eletrônicos em nível nacional e identificar precocemente doenças por meio da análise de exames diagnósticos e da correlação inteligente de dados médicos aparentemente desconexos”, afirma Raposo.
Segundo ele, essa plataforma conseguiria reunir dados estruturados e não estruturados provenientes de hospitais, clínicas, laboratórios, farmácias, e dispositivos como fitbits, Apple Watch e Samsung Watch, criando um prontuário eletrônico longitudinal e dinâmico capaz de oferecer uma visão completa e contínua da jornada do paciente.
“Isso permite que médicos e profissionais de saúde visualizem o histórico clínico completo de cada paciente, reconhecendo padrões imperceptíveis e sinais iniciais de doenças que muitas vezes passam despercebidos em abordagens convencionais”, ressalta o especialista.
Redes neurais, treinadas com o apoio de equipes médicas especializadas, realizariam análises autônomas de ressonâncias magnéticas, tomografias, radiografias, ultrassons e até mesmo imagens enviadas por pacientes por meio de seus celulares. O objetivo, segundo o arquiteto, é detectar microtumores, alterações vasculares e outras complicações médicas ainda em fases iniciais.
“Em paralelo, modelos de linguagem natural processariam dados não estruturados, incluindo conversas médico-paciente, anotações clínicas e transcrições de consultas, para revelar sintomas e fatores de risco muitas vezes ocultos em sistemas fragmentados”, observa.
De acordo com Raposo, ao correlacionar essas informações com dados populacionais e históricos clínicos, a plataforma seria capaz de emitir alertas personalizados sobre o risco de progressão de doenças crônicas, bem como antecipar surtos de doenças infecciosas com potencial epidêmico.
“Combinada a análises preditivas, esse tipo de automação permitiria gestores de saúde mapear áreas de risco em grupos populacionais, coordenar campanhas de vacinação, otimizar recursos e atuar de maneira proativa em emergências sanitárias”, destaca.
O especialista ressalta que soluções com IA já vêm sendo aplicadas em diversos países para transformar a gestão em saúde. Como referência, ele cita a plataforma inteligente de prontuário eletrônico que arquitetou em parceria com o Ministério da Saúde da Província de Ontário, no Canadá, atualmente em operação em 120 hospitais e clínicas da região.
“Essa iniciativa incorporou IA para a análise autônoma de exames, incluindo ressonâncias, tomografias e radiografias, o que permitiu identificar doenças críticas em estágios iniciais e impulsionar ações preventivas em larga escala”, explica Raposo.
“Além disso, a arquitetura unificada do prontuário eletrônico nacional consolidou, em uma única plataforma, dados de pacientes, diagnósticos médicos e exames de imagem. A documentação não pode ser um obstáculo entre profissionais de saúde e pacientes, ela precisa ser invisível, intuitiva e segura”, enfatiza o especialista.
Raposo ainda afirma que o desenvolvimento de novas soluções com IA não tem como objetivo substituir médicos e enfermeiros, mas atuar como um suporte estratégico, eliminando tarefas repetitivas e fortalecendo a tomada de decisões. Dessa forma, a tecnologia abre espaço para que os profissionais de saúde dediquem mais tempo ao cuidado direto dos pacientes, defende ele.
Por outro lado, o especialista reconhece que ainda existem desafios econômicos e regulatórios para a adoção em larga escala de tecnologias de IA nas unidades de saúde. Para ele, é essencial que os governos atuem como agentes de transformação, implementando políticas que estimulem a inovação e direcionando investimentos para fortalecer a infraestrutura digital necessária.
“Promover parcerias público-privadas é crucial para impulsionar o desenvolvimento e a adoção de soluções inovadoras. Ao mesmo tempo, gestores públicos têm a responsabilidade de assegurar a inclusão digital, permitindo que todos os cidadãos aproveitem essas transformações, e de definir regulamentações sólidas que preservem a ética e a segurança no uso de dados”, conclui Raposo.
Sobre Hugo Raposo
Hugo Raposo é um executivo de tecnologia e arquiteto de software com mais de 28 anos de experiência liderando iniciativas de transformação digital em saúde, governo e setores altamente regulados. Atuou como arquiteto-chefe de uma das plataformas provinciais do Canadá, onde liderou o desenvolvimento de soluções baseadas em Inteligência Artificial para reduzir a sobrecarga clínica, automatizar processos e fortalecer a gestão integrada do atendimento.