O Show Antidemocrático da Oposição: Quando a Extrema Direita Testa os Limites da Democracia Brasileira

Por Fúlvio B. G. de Castro
Professor de Sociologia e Bacharel em Direito.
Na tarde do dia 05 de agosto de 2025, o Congresso Nacional foi palco de um espetáculo que escancarou a dificuldade da extrema direita em conviver com as regras do jogo democrático. Parlamentares bolsonaristas interromperam o início da sessão legislativa, promovendo uma cena grotesca de protesto: com esparadrapos na boca, tentaram simbolizar uma suposta censura enquanto, na prática, impediam o funcionamento de uma das instituições basilares do Estado Democrático de Direito — o Parlamento.
Este episódio ilustra com precisão o conflito entre duas visões de mundo: de um lado, o compromisso com o rito processual, que é o alicerce de qualquer democracia; de outro, a nostalgia de um regime de exceção, onde a força bruta e a vontade de poucos se sobrepõem às leis e às instituições.
Os parlamentares que hoje protagonizaram esse constrangimento institucional o fizeram para defender seu líder político, Jair Bolsonaro, que enfrenta uma série de processos judiciais por atos que atentaram diretamente contra a ordem democrática. Desde a tentativa frustrada de golpe de Estado, passando por planos terroristas envolvendo carro-bomba, homem-bomba e até complôs de assassinato, a extrema direita brasileira não aceita a legitimidade do processo eleitoral e tenta, agora, inviabilizar a responsabilização penal de seus líderes.
Enquanto países com democracias consolidadas tratam seus conflitos políticos dentro das regras institucionais, a extrema direita brasileira prefere o caminho do caos. Não bastasse a tentativa de constranger o Congresso, mobilizam campanhas internacionais para desmoralizar o Brasil no exterior, sem nenhum pudor em prejudicar a soberania nacional, desde que isso sirva para blindar a família Bolsonaro.
O contraste com a trajetória recente de Lula é inevitável. Preso por 580 dias após um processo judicial repleto de vícios — condenado sem provas materiais por um juiz que, posteriormente, seria considerado parcial e suspeito — o ex-presidente seguiu rigorosamente o caminho legal, recorrendo às instâncias superiores sem jamais atentar contra a estabilidade das instituições. Em nenhum momento, houve incentivo a ataques ao Supremo Tribunal Federal (STF), pedidos de impeachment de ministros ou ações para desacatar decisões judiciais. A postura foi de respeito ao rito processual, mesmo diante de um processo que, hoje, é amplamente reconhecido como um empreendimento de natureza política.
Essa diferença de conduta não é apenas simbólica, é pedagógica. Ensina que um Estado Democrático de Direito se constrói não pela ausência de conflitos, mas pela forma como estes são processados e resolvidos dentro dos marcos legais. Aqueles que tombaram ou foram torturados durante o regime militar, como símbolo da luta por liberdade, jamais aceitaram que a democracia fosse usada como escudo para golpes ou ameaças.
É curioso que os mesmos que exaltam torturadores como o coronel Brilhante Ustras, e que mitificam a própria força física como Bolsonaro, demonstra tamanha fragilidade frente às consequências legais de seus atos. Bolsonaro, que se vangloriava de seu “histórico de atleta”, não suportaria dez minutos de tortura com Ustras que ele idolatra.
A democracia exige paciência com os ritos, respeito às derrotas e compromisso com as regras, não com mitos. Como bem disse Lula ao recusar o uso de tornozeleira eletrônica: “Quem usa anel no pé é pombo”. Para ele, a escolha foi pela dignidade de enfrentar a prisão, não pela covardia de subverter as instituições.
O Brasil, mais uma vez, está diante da necessidade de escolher entre civilização e barbárie. O protesto tosco de hoje é apenas um retrato daquilo que, pedagogicamente, politicamente e corajosamente, precisa ser derrotado.
Foto: Saulo Cruz/Agência Senado