Sobre o Dia do Professor

Sobre o Dia do Professor

Daniel Medeiros*

Depois de 35 anos, voltei a assistir Sociedade dos Poetas Mortos.
Na primeira vez, no cinema, lembro que saí profundamente tocado pela experiência daquele professor inglês que ensinava a importância do presente aos seus jovens alunos da elite branca norte-americana, tão obcecados pelo futuro. Na época, eu era um jovem professor e sentia-me membro dessa confraria de adeptos do carpe diem — mas certamente sem a maturidade, nem mesmo o tempo disponível e as condições financeiras para exercer a autonomia que, embora uma aspiração iluminista de pretensões universais, é possível para poucos, muito poucos. E eu não era um desses poucos — pelo contrário.

Recordo-me de que, nessa época, já casado, dava três turnos de aulas e, em alguns dias, começava às 7h15 e terminava às 23h. Exausto, zonzo, não conseguia reunir forças para nada além de alimentar-me, tomar banho e dormir — para, no dia seguinte, repetir, pedra acima, a jornada. Não obstante, como dizia o poeta, à parte isso, tinha em mim todos os sonhos do mundo.

Fui ver o filme que uma aluna havia me indicado porque — supremo elogio — achava-me parecido com o Sr. Keating, o personagem interpretado pelo melancólico e sofrido ator Robin Williams, que se suicidaria décadas depois. Quem sabe por não ter prestado muita atenção às palavras que representou nesse filme ou — sei lá — quem pode saber o que se passa na alma humana?

Vi o filme e, como disse, saí mesmerizado pelo “Capitão, meu capitão”, e imaginei-me mesmo sendo um pouquinho capaz dessas proezas do encantamento com meus alunos. Pois, pouco tempo depois, recebi uma cartinha de outro aluno: ele também havia visto o filme e me identificara com o personagem. Fiquei extático. Seria possível que, de fato, eu estivesse fazendo alguma diferença para aqueles jovens?

Eu, que não via o dia passar, que repetia e repetia aulas em troca de pagar as contas, pensar em ter um filho um dia, sonhar com uma viagem à Itália, quem sabe trocar o carro velho, aprender uma língua, fazer um mestrado… E assim iam-se meus dias, meus meses e anos — eu, sempre trabalhando e trabalhando. Será que, nos desvãos da minha rotina diária, sem que eu percebesse, um pouco dos meus sonhos escapava de dentro de mim e impressionava alguns daqueles alunos?

E desde então, lá se foram as décadas.
Tive um filho — maravilhoso —, depois adotei mais duas filhas — espetaculares. Comprei uns três ou quatro carros, viajei bastante (e continuo viajando), aprendi mal e mal algumas línguas — o que me tornou apto a me comunicar, mas não a refletir ou debater além do português. Fiz mestrado, doutorado, pós-doutorado — este, aliás, meu desafio atual — e continuo na escola, dando aulas.

O ritmo, porém, mudou muito. Alcancei aquela autonomia que é para poucos. Ganhei meus dias de folga, minhas noites em casa, com meus livros e meus filmes. O sonho da modernidade, conquistei-o.


E então revi Sociedade dos Poetas Mortos e, de novo, emocionei-me com o Sr. Keating e com essa tarefa de encantar jovens que a docência pode, às vezes, promover.

Uma passagem, em especial, destacou-se para mim nessa segunda “leitura” do filme. O diretor, depois de castigar com uma palmatória um dos jovens que havia publicado um artigo no jornal da escola pedindo o ingresso de garotas, tenta admoestar o Sr. Keating, dizendo-lhe: “O senhor deveria ter cuidado com o que faz com esses jovens; eles são muito impressionáveis nesta idade.”
E o Sr. Keating então respondeu: “O senhor ontem causou uma forte impressão nele.”

Isso! Isso! — pensei comigo, sozinho na sala de minha casa, assistindo ao filme. Esse é o segredo do encanto que o filme proporciona: ele defende a liberdade e a paz que só o respeito pelo outro é capaz de promover. O diálogo difícil com outras gerações, por mais penoso e frágil que seja, é o único caminho para buscarmos um mundo melhor. E isso não é uma tarefa para o futuro, mas para o presente. Para o agora. E não podemos deixá-lo escapar.

Curiosamente, assisti, na mesma semana, Steve — filme produzido e estrelado pelo ator Cillian Murphy —, sobre o desafio de um professor diante de uma instituição para jovens vulnerabilizados, sem recursos, sem pessoal e sob ameaça de fechamento. Apesar disso, o professor se desdobra em buscar um relacionamento humano com aqueles jovens que, por pouco, ainda não haviam perdido sua humanidade.

Tudo é difícil, tudo é precário, tudo parece prestes a ruir a qualquer momento, enquanto uma equipe de televisão percorre os corredores da escola e entrevista alunos e professores para um programa, buscando destacar a impossibilidade daquele projeto, enfatizando o conhecido “não tem jeito mesmo”.

Mas não era o que pensava o professor — nem sua equipe.
O amor (philia) não traz recursos nem é capaz de dissolver o passado daqueles jovens. Mas é capaz de lhes dar um presente — um dia de cada vez.
Aliás, o tempo de duração da história do filme: um dia.

Um dia com conversas, respeito, energia, atividades, escuta, abraços — há uma cena de um abraço coletivo que é a síntese de tudo isso —, com a certeza de que, apesar da raiva, da frustração, da falta de dinheiro, tempo e solidariedade das autoridades, é possível fazer um dia ser melhor. Carpe diem.

P.S.: O Sr. Keating e o Sr. Steve são os professores que eu sempre quis ser. Se fui, se sou, não sei — porque não sou eu quem me nomeia.
Mas o desejo é meu.
E, se persisto na profissão há 42 anos, é porque a emoção de ser só um pouquinho assim ainda me empurra, dia a dia, para a alegria e para o desafio do meu trabalho.

*Daniel Medeiros é doutor em Educação Histórica, pós-doutorando em Bioética e professor no Curso e Colégio Positivo. @profdanielmedeiros

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