Havaianas todo mundo usa. Cérebro, pelo visto, nem todos
Dizer que 2026 deve ser encarado com os dois pés, e não apenas com o direito, só pode soar como ofensa para quem pretende atravessar o próximo ano com metade do cérebro desligado. Para qualquer pessoa minimamente disposta a pensar, a mensagem do novo comercial da Havaianas é simples, positiva e até óbvia: união, equilíbrio e responsabilidade coletiva.
Não há ataque político, não há ideologia disfarçada, não há militância escondida na sandália. Há apenas uma metáfora clara: caminhar exige os dois pés. A reação histérica de alguns diz muito mais sobre quem se sentiu atingido do que sobre a campanha em si. Se uma mensagem de união incomoda, o problema não está no anúncio — está no espelho.
A ironia fica ainda maior quando se olha para o passado recente. Em 2014, a própria Havaianas brincou com a superstição nacional de “não entrar com o pé esquerdo”. A campanha foi protagonizada por Romário, explorando humor, futebol e cultura popular. O pé esquerdo virou piada, leveza, identidade brasileira. Todo mundo riu. Todo mundo curtiu. Ninguém gritou “doutrinação”. Ninguém falou em boicote. Não houve preconceito, só criatividade.
O que mudou de lá para cá não foi a Havaianas. Foi parte do público, que passou a ver ameaça onde antes via humor, e inimigo onde antes via metáfora. A sandália continuou sendo sandália. Quem ficou mais duro foi o pensamento.
O comercial atual não manda ninguém votar, não manda ninguém pensar igual, não impõe comportamento. Apenas lembra que seguir adiante exige equilíbrio. Que andar mancando de um lado só leva, cedo ou tarde, à queda. Entrar com os dois pés é maturidade. É reconhecer que o país não se constrói com birra, nem com boicotes seletivos, nem com leitura rasa de mensagens simples.
No fim das contas, a Havaianas fez o que sempre fez: usou símbolos cotidianos para falar de Brasil. Quem transformou isso em guerra ideológica foi quem já estava procurando briga. Porque para quem entra em 2026 inteiro, com os dois pés e a cabeça funcionando, a mensagem não ofende. Orienta.
E talvez seja exatamente isso que incomoda.



