Cristãos com bandeira? OPEM deveria levantar a da paz

Diante da nova escalada de tensão entre Israel e Irã, era de se esperar que líderes religiosos manifestassem preocupação com as vítimas e com os riscos de uma tragédia humanitária. No entanto, o que vimos foi uma nota oficial da Ordem dos Pastores Evangélicos de Maringá (OPEM) se posicionando politicamente contra o governo brasileiro e declarando apoio irrestrito a um dos lados do conflito.
Com todo respeito às convicções religiosas de cada um, é preciso lembrar que fé não pode ser confundida com ideologia, nem o púlpito transformado em palanque. Apoiar a guerra, ainda que indiretamente, é incompatível com os ensinamentos de Cristo. Mais grave ainda é justificar esse apoio como se o atual Estado de Israel fosse um símbolo do cristianismo ou da fé evangélica. Isso simplesmente não é verdade.
Dados oficiais mostram que cerca de 73,5% da população israelense é judia, 18,1% é muçulmana e apenas 1,9% é cristã. Ou seja, Israel não é um país cristão, nem em sua cultura majoritária, nem em sua estrutura política ou religiosa. A maioria dos cristãos israelenses é árabe, e muitos deles também são vítimas dos conflitos armados. Ignorar isso é fechar os olhos para uma realidade complexa e dolorosa.
A igreja deveria ser um espaço de acolhimento, de construção da paz, de oração pelos que sofrem. Em vez de notas de repúdio, por que não uma nota de apelo pelo cessar-fogo? Por que não um clamor público para que as nações envolvidas encontrem uma saída diplomática e poupem vidas inocentes? Veja a nota oficial da OPEM:

NOTA OFICIAL
A Ordem dos Pastores Evangélicos de Maringá – OPEM, diante da recente manifestação do Governo Brasileiro, que condenou as ações do Estado de Israel em sua legítima defesa contra o regime iraniano, vem a público expressar seu total repúdio à referida nota.
Como cristãos evangélicos, reafirmamos nosso compromisso inegociável com a Nação de Israel, reconhecendo-a como a terra prometida por Deus, segundo as Escrituras. A Palavra de Deus é clara ao afirmar que “abençoarei os que te abençoarem” (Gênesis 12:3), e a história comprova que quem está ao lado de Israel prospera.
Lamentamos que o Governo Brasileiro, especialmente sob a liderança do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, insista em adotar posições ideológicas equivocadas, frequentemente alinhadas a regimes autoritários e a grupos que apoiam o terrorismo, como o Hamas e o regime iraniano. É inaceitável que se critique Israel por exercer o seu direito soberano à autodefesa, especialmente contra um regime que enriquece urânio para fins claramente bélicos e que ameaça abertamente a paz mundial.
Declaramos nosso total apoio ao Estado de Israel e conclamamos os cristãos brasileiros a orarem por Jerusalém e a se manterem firmes na defesa dos valores bíblicos e da verdade.
Deus abençoe Israel. Deus abençoe o Brasil.
Maringá, 22 de junho de 2025.
OPEM – Ordem dos Pastores Evangélicos de Maringá
Israel atual não é o mesmo da Terra Prometida bíblica. O Estado moderno foi criado em 1948, por decisão política e internacional, e, embora tenha identidade judaica, é um Estado laico. Já a Terra Prometida era uma promessa religiosa feita a Abraão, envolvendo uma área mais ampla e concebida sob um governo teocrático. Hoje, cerca de 40% a 45% dos judeus israelenses se identificam como seculares (hiloni); ou seja, não seguem práticas religiosas regularmente. Confundir esses dois conceitos é misturar fé com política, o que pode gerar interpretações equivocadas.
Jesus nunca tomou partido em guerras. Pelo contrário, disse: “Bem-aventurados os pacificadores, porque serão chamados filhos de Deus”. Ele nos chamou para sermos pontes e não muros; para defender a vida, e não regimes ou bombas.
Jesus não deixou dúvidas sobre qual era a bandeira que carregava. Em diversas passagens do Evangelho, Ele demonstra que sua mensagem é de paz, reconciliação e amor, mesmo diante da violência e da injustiça. Suas palavras seguem ecoando como um chamado firme contra o ódio e a guerra.
“Bem-aventurados os pacificadores, porque serão chamados filhos de Deus.” (Mateus 5:9) Jesus valoriza aqueles que constroem a paz, e não quem estimula o conflito. Para Ele, pacificar é agir como verdadeiro filho de Deus.
“Ouvistes que foi dito: ‘Amarás o teu próximo e odiarás o teu inimigo’. Eu, porém, vos digo: Amai os vossos inimigos e orai pelos que vos perseguem.” (Mateus 5:43-44) — Ele quebra a lógica da vingança e ensina que o amor deve ser a resposta até mesmo ao ódio e à perseguição.
“Guarda a tua espada, pois todos os que lançarem mão da espada, à espada morrerão.” (Mateus 26:52) Ao repreender Pedro, que tentou defendê-lo com violência, Jesus desautoriza o uso da força, mesmo em legítima defesa. Ele mostra que o caminho da espada leva apenas a mais sofrimento.
“O meu Reino não é deste mundo. Se o meu Reino fosse deste mundo, os meus servos lutariam para que eu não fosse entregue…” (João 18:36) Jesus deixa claro que não busca poder ou domínio político. Seu reino é espiritual, não conquistado com guerras, mas com amor.
A mensagem de Jesus é, indiscutivelmente, uma mensagem de paz. Ele não apenas pregou isso com palavras, mas viveu essa verdade até o fim, sem recorrer à violência, mesmo diante da cruz.
A mistura entre fé e política externa, ainda mais quando resulta em apoio a conflitos, apenas afasta a igreja de sua missão original. Que os pastores e líderes religiosos reflitam: vale mais uma declaração ideológica ou um compromisso verdadeiro com a paz?
Se a igreja não for capaz de orar pela paz, quem será?