Brincar ou aprender? Será possível escolher?

Brincar ou aprender? Será possível escolher?

Bruna Fachini*

Certa vez, num cantinho do parque de areia, duas crianças brincavam com bonecas, areia e panos. Ao me deparar com a peculiaridade daquela cena, me aproximei para observar. Uma delas enrolava a barriga da boneca com os panos coloridos, enquanto a outra estava compenetrada fazendo bolinhas de areia com as mãos. Em certo momento, um diálogo interessante começou:

-“Minha filha acordou com muita dor de barriga, esses panos quentes fazem a dor ir embora!” – G., 5 anos.

-“Eu acho que dor de barriga só passa com remédios. Esses pequenos são para tomar de manhã, os grandes só para noite.” (Falava enquanto enrolava bolinhas de areia grandes e pequenas.) – T., 5 anos.

– “Não pode dar remédios para bebê. Só chá de camomila.” – G., 5 anos.

– “Mas eu sou cientista. E inventei remédios bons para bebês!” – T., 5 anos

Seria possível entender tal situação de maneiras distintas: encarar como uma simples brincadeira de criança ou enxergar ali uma possibilidade incrível para aprender? Veja quantos conteúdos essas meninas abordaram e discutiram em apenas quatro frases: doenças, temperatura, medidas de massa, divisões do tempo em dia e noite, profissões, fases da vida, tradições culturais… Sem contar a execução de habilidades orais, capacidade de argumentação, resolução de problemas. Enfim, são tantos conceitos que precisaríamos de vários dias e planejamentos para discorrer cada uma deles de forma isolada em uma sala de aula. Percebem que a brincadeira para a criança significa vivenciar, experimentar o que ela percebe do adulto? A brincadeira está intrínseca nessa fase, não conseguimos separar, ou pedir para que ela pare de acontecer.

Por meio da ludicidade, a criança aborda seus conflitos internos, constrói seus conceitos, resolve medos, expressa as angústias, manifesta os prazeres, amadurece suas teorias, testa as incertezas. Resumindo, é brincando que ela aprende. Posto isso, acredito que não devemos separar os momentos de aprendizagem dos momentos de brincadeiras; eles acontecerão simultaneamente e, justamente por isso, estarão interligados. 

De acordo com estudos da neurociência, os períodos de brincadeira favorecem conexões entre diversas áreas do cérebro, as quais estão diretamente ligadas à capacidade de aprender. Portanto, se a aprendizagem estiver vinculada à diversão, despertaremos em nossos alunos o desejo de aprender cada vez mais. 

Diante do acima exposto, penso que são poucas as pessoas que contestam a necessidade de proporcionar momentos para brincar na Educação Infantil, não é mesmo?

E quando os alunos passam para o Ensino Fundamental, as brincadeiras devem cessar? De acordo com o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), no art. 2 “Considera-se criança, para os efeitos desta lei, a pessoa até doze anos de idade incompletos”. Ou seja, a infância não termina na Educação Infantil, tendo em vista que os estudantes completam 12 anos apenas quando estiverem no Fundamental 2. Além disso, esse mesmo documento nos apresenta que todas as crianças devem exercer o “direito a brincar, praticar esportes e divertir-se” – Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), 1990 – art. 16.

Ou seja, brincadeira na infância não se trata de opção ou questionamento, mas, sim, de ofertar à criança o que é seu por direito. Logo, por mais óbvio que pareça, não podemos esquecer que os alunos que ingressam no Ensino Fundamental continuam sendo crianças e, assim sendo, devem ser tratados como tal. Vale enfatizar que essa fase escolar trará novas responsabilidades e demandas, as quais auxiliarão no amadurecimento e sistematização dos conteúdos propostos para cada série. Todavia, brincadeiras livres e momentos lúdicos intencionalmente planejados devem estar presentes cotidianamente, justamente por serem aliados nesse processo de aprendizagem. E, para além de tudo isso, penso no quanto seria bom se pudéssemos não parar de brincar nunca!

Como seria perfeito se, mesmo depois de adultos, nos permitíssemos, por exemplo, deitar na grama e criar personagens com o formato das nuvens; encarar a chuva como uma bela oportunidade de tomar um banho divertido; cantar bem alto aquela música que tanto amamos, sem se importar com a afinação; olhar no espelho sem a preocupação com as linhas do tempo, e, ao invés disso, fazer uma careta e rir do que observamos?! Acredito que teríamos um mundo bem mais leve e feliz se conseguíssemos manter viva, dentro do nosso coração, a criança que todos nós um dia já fomos!

*Bruna Fachini, assessora da Educação Infantil e anos iniciais do Sistema Positivo de Ensino.

Redação

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